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Foto do escritorpor Rica Inocente

Vamos falar sobre a tal reforma tributária

O sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos do mundo, mas o que é essa mudança e como ela impacta o dia a dia da população?

Existem três projetos em discussão a respeito da reformulação dos tributos do país (Foto: Unsplash)
Existem três projetos em discussão a respeito da reformulação dos tributos do país (Foto: Unsplash)

A reforma tributária tem sido uma pauta muito discutida nas últimas semanas. Contudo poucos sabem quais os impactos dessa mudança na vida comum e quais serão as alterações que a proposta sugere.


O projeto é a grande promessa de Paulo Guedes, Ministro da Economia, e sua primeira parte foi entregue ao Congresso no dia 21 de julho e teve uma solicitação de urgência, publicada no Diário Oficial da União, do presidente Bolsonaro para que sua análise tivesse prioridade.


Um dos objetivos defendidos pelos formuladores é que a proposta vai simplificar a cobrança de tributos, sendo visto por investidores externos como o sistema mais complexo do mundo.


Para exemplificar isso de maneira clara, o relatório Doing Business” do Banco Mundial, publicada em 2019, colocou o Brasil na 184ª posição no critério de “pagamento de impostos” em uma lista de 190 países. O país gasta em média 1.958 horas/ano lidando com os impostos. O México, por exemplo, investe apenas 240,5 horas/ano.


Mas a reforma tributária vai muito mais a fundo do que a simplificação do sistema tributário brasileiro. Para esclarecer isso, o por Rica Inocente preparou um pequeno guia para você entender o que está acontecendo. Acompanhe!


O que é uma reforma tributária?

A última vez que o Brasil mexeu no sistema tributário foi durante a ditadura militar (Foto: Unsplash)
A última vez que o Brasil mexeu no sistema tributário foi durante a ditadura militar (Foto: Unsplash)

A mudança é uma reformulação do sistema de pagamento e cobrança de impostos e tributos. O objetivo pode ser aumentar ou diminuir a quantidade de impostos ou decidir se haverá maior arrecadação ou não da receita proveniente das cobranças.


A única vez que o Brasil discutiu sobre a reforma tributária e implantou medidas definitivas foi na década de 60, durante a ditadura militar. Após isso, algumas adaptações foram realizadas, mas nada que interferisse na base principal do sistema tributário brasileiro.


O que a reforma tributária propõe?

Para falar sobre o projeto é preciso saber que existem três proposta de “reforma tributária” em andamento. Desde 2019 o tema é discutido pelo Senado e pela Câmara e nos dois grupos existem propostas diferentes da reformulação.


Em fevereiro deste ano, o presidentes do Senado, Davi Alcolumbre, e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, criaram uma comissão mista para avaliar as propostas e criar um texto em consenso para a reforma tributária.


As discussões foram adiadas devido a pandemia do novo coronavírus, mas as duas casas acreditam que o projeto é de extrema importância para o Brasil. A entrega de uma nova proposta só mostra como estão ansiosos por uma mudança, independente do seu impacto.


Mas se elas são tão relevantes para a economia do país, o que elas propõem?


PEC 45 - Câmara dos Deputados

O texto desenvolvido pela Câmara dos Deputados sugere a unificação de cinco impostos bem conhecidos:

  • Imposto sobre produtos industrializados (IPI);

  • Programa de Integração Social (PIS);

  • Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);

Estes três primeiros são de ordem federal;

  • Imposto sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS), de valor estadual;

  • Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), de alcance municipal;

A reforma da Câmara propõe que estes tributos sejam unificados e substituídos por uma única cobrança, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).


É Importante ressaltar, não apenas nessa PEC, mas como nos outros dois textos da em discussão, é que a unificação de impostos tem impactos negativos e positivos em muitas empresas. Alguns ramos vão pagar mais impostos do que outros, pois nessa mudança vão arcar com valores que antes não eram cobrados do seu setor.


PEC 110 - Senado


Por outro lado, os senadores foram mais ambiciosos na sua proposta. Na primeira parte eles pretendem extinguir 9 impostos diferentes.


Federais:

  • IPI;

  • PIS;

  • Cofins;

  • Imposto sobre Operações Financeiras (IOF);

  • Programa de Formação do Patrimônio do Servidor (Pasep);

  • Salário Educação (Contribuição social destinada ao financiamento de programas);

  • Cide-Combustível (Contribuição social destinada ao investimento da infraestrutura e transporte);

Estadual:

  • ICMS

Municipal:

  • ISS


Nesta reforma, eles também citam a criação do IBS, mencionado no texto da Câmara e menciona um tributo sobre bens e serviços específicos, nomeado Imposto Seletivo, de competência federal.


O “Imposto Seletivo” seria cobrado sobre o petróleo e seus derivados, cigarros, energia elétrica e serviços de telecomunicação. Além disso, a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) seria extinto e incorporado ao imposto de Renda, que terá alíquotas ampliadas.


Outro ponto é que o IPVA passa a valer para aviões e barcos e deixa de ser cobrado de veículos comerciais destinados à pesca, transporte público e cargas com maior capacidade contributiva.


O Senado elaborou um texto muito mais complexo do que o da Câmara, mas em ambos os casos eles mencionam a unificação/extinção de impostos para criar um único que seria responsável por todas as tributações que foram suspensas.


Proposta do Ministério da Economia

O posto Ipiranga do governo brasileiro, Paulo Guedes, apostou muito no seu projeto. A proposta em discussão é apenas a primeira parte de um texto de três etapas, que deve ser entregue até o final de agosto.


O ministro acredita que, como suas modificações não interferem na Constituição, precisam apenas ser aprovadas como uma PEC, ela será de fácil tributação pelo Congresso.


Mas o presidente do Senado afirma que a proposta de Guedes pode ser incorporada ou aperfeiçoada com os outros textos em discussão, tornando o caminho da aprovação mais prolongado.


O que o governo federal propõe:

Nesta parte, o que mais é discutido é a alíquota estipulada pela simulação do Ministério da Economia sobre o IVA. A pasta prevê uma taxa de 11% a 12%, sendo que alguns setores terão que arcar com porcentagens diferentes.


Por exemplo, a taxa de 12% seria cobrada das empresas e uma quota de 5,8% seria destinada a instituições financeiras, planos de saúde e seguradas, pois segundo o governo “não apropriam nem permitem a apropriação de créditos”.


A reforma de Guedes também implica no combustível e seus derivados. Esses produtos serão taxados em um regime tributário diferente. Já os cigarros mantém a tributação elevada. A proposta deixa de fora a cobrança de produtos da cesta básica, como a farinha, carnes e leite.


Com essas alterações um estudo do Observatório de Política Fiscal, do Ibre/FGV, mostra que a criação da CBS elevaria a arrecadação federal em cerca de R$ 50 bilhões. Entretanto, como mencionado anteriormente, o projeto será incorporado aos outros discutidos pela Comissão Mista.


Caso aprovado, a reforma tributária entra em vigor seis meses após o veredicto.


Mas não para por aí …

O texto entregue é apenas a primeira parte. Num futuro próximo, Guedes pretende apresentar o restante do seu plano, que quer manter a arrecadação atual e não pretende destinar parte destes lucros aos estados e municípios


Apesar dos itens que podem ser comparados entre as propostas, o ministro da economia tem intenções diferentes do Senado e da Câmara. Exemplo disso é que ele já manifestou interesse em criar novos imposto, que vai de encontro com o que foi falado por Alcolumbre e Maia.


Para uma segunda parte da reformulação, alguns tópicos já foram mencionados, como:

  • criação de um imposto seletivo, apenas para produtos específicos, como o Imposto sobre Produtos Industriais (IPI);

  • mudanças no Imposto de Renda. O ministro pretende reduzir a alíquota do IR para a Pessoa Jurídica, aumentar a faixa de isenção para a Pessoa Física e diminuir as deduções;

  • retorno da taxação sobre a distribuição de lucros e dividendos. No regime atual, só as empresas são tributadas pelo lucro, com a mudança, os acionistas da empresa vão arcar com esses impostos também;

  • criação de um tributo sobre comércio e pagamento em meios eletrônicos, com uma alíquota de 0,2%;


Os impostos sobre os movimentos financeiros eletrônicos pode diminuir o uso do sistema bancário e reduzir a arrecadação do governo, entre outro prejuízos.


Outro ponto polêmico da segunda parte da reforma tributária de Guedes é a desoneração da folha de pagamento. O objetivo dos cortes dos tributos seria o estímulo para a criação de empregos, mas a mesma tática de reduzir ou cortar encargos da folha foi realizado durante o governo de Dilma Rousseff e não teve o resultado esperado.


Tá, mas como isso implica na vida dos brasileiros?

As propostas apresentadas causam um impacto no dia a dia da população e isso deve ser mencionado. A reforma tributária está sendo vendida como uma simplificação do sistema do país, assim como uma fonte de incentivo para o reaquecimento econômico, mas como isso afeta a população?


O Ministério da Economia acredita que essa mudança pode criar um modelo mais neutro, homogêneo e transparente. Mas as análises prévias não mostram isso. Uma das discussões que foram levantadas nas redes sociais é a tributação dos livros, mas poucos sabem o que realmente vai acontecer.


De acordo com o projeto apresentado por Guedes, a reforma irá extinguir a renúncia fiscal do PIS/Pasep e Cofins para livros, biodiesel, cadeiras de rodas e aparelhos auditivos, assim como embarcações e aeronaves, indústria cinematográfica e alguns outros.

Isso quer dizer que a indústria de produção de livros não receberá o benefício de redução do custo e com isso o governo federal irá faturar 12% sobre a receita bruta das editoras. Os exemplares que mais vão sentir o impacto da nova tributação serão os livros didáticos e a bíblia, que são os mais produzidos no país.


Em contrapartida, a reformulação irá disponibilizar exceções como os benefícios fiscais do PIS/Cofins que serão mantidos na Zona Franca, em Manaus, para os empresários do regime do Simples Nacional e para os produtos da Cesta Básica.


Além disso, o imposto criado a partir da unificação do PIS e Cofins, o CBS, não irá incidir sobre pessoas jurídicas que não exercem atividades econômicas como igrejas, partidos políticos, sindicatos, fundações, serviços sociais, entre outros.

Mas alguns setores da economia não estão felizes com a taxa fixa de 12%. Segundo entrevista dada ao G1, o presidente da Confederação Nacional de Serviços (CNS), Luigi Nese, a reforma terá impacto negativo no setor da agropecuária, indústria extrativa, construção civil e dos serviços privados não financeiros, havendo um aumento na carga tributária desses ramos.


Por outro lado, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), vê a aprovação do texto como uma vitória, caso aconteça. A proposta isenta a tributação de vendas de imóveis residenciais e isso terá efeito decisivo sobre o preço dos imóveis e para o mercado imobiliário.


O setor mais prejudicado será o de serviços, devido ao aumento da tributação caso a reforma seja aprovada. Com as diversas críticas que recebeu sobre a taxa de 12%, Paulo Guedes disse que ela poderá ser revista caso pareça muito elevada.


Contudo isso é apenas uma suposição geral do que pode acontecer caso o projeto venha a ser aprovado. O impacto real só poderá ser contabilizado se o texto ganhar a empatia do Congresso.


Do ponto de vista de especialistas

O Nexo Jornal fez um levantamento das análises de dois especialistas em reforma tributária e apontou os prós e contras e o por Rica Inocente vai citar algumas das partes mais relevantes do texto.


Os entrevistados foram o professor de economia da Unicamp, Eduardo Fagnani, e o coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV e diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), Eurico de Santi.


Entre os principais pontos que foram discutidos estão:


Análise geral da reforma de Paulo Guedes

O professor da Unicamp, Eduardo, acredita que o texto, assim como as outras propostas em análise no Congresso são injustos e limitados. Fagnani diz que é controverso lidar com a crise atual com simplificação de tributação de consumo.


Quanto a injustiça, ele afirma que o país cobra muito o consumo e não tributa grandes riquezas. Nenhuma das propostas muda esse sistema, o que aumentaria a desigualdade da sociedade.


Já Santi acredita que o projeto “está muito bem escrito e foi muito bem defendido”. O especialista afirma que o PIS/Cofins é um imposto ruim e que a reforma apresenta soluções de modelos internacionais de sistemas tributários.


Diferença do CBS entre setores


Fagnani também acredita que a diferenciação da taxa para bancos e outros setores é injusto. Segundo o professor, o ministro da economia busca defender os grandes bancos, que são os meios mais lucrativos do Brasil.


Como maior lucro, os acionistas dessas instituições são bem remunerados e por sua vez, estes não pagam nenhum tipo de tributação sobre os lucros e dividendos do banco. Acaba que o banco se sai muito melhor em comparação a um cidadão comum na hora de pagar impostos.


Por outro lado, o diretor da CCif, Eurico, afirma que a percepção que os bancos vão sair ganhando com a taxa mais baixa é equivocada. Os bancos possuem alíquotas cumulativas, o que gera cobranças em cascata.


Discutir reforma tributária durante um pandemia


O professor da Unicamp, Eduardo Fagnani, afirma que o país é um dos mais desiguais do mundo e o seu sistema tributário é muito injusto. Mas apesar disso, as propostas em discussões não são as mais efetivas para corrigir os problemas do país.


Fagnani acredita que a reforma tributária deveria discutir a tributação sobre altas rendas, isentar pessoas físicas que recebem até três salários mínimos, impor juros sobre grandes fortunas e mexer no imposto sobre doações e heranças. Nas palavras do professor a reforma tributária imposta “é uma reforma sobre a tributação do consumo”.


Eurico afirma categoricamente que este é o momento ideal para discutir sobre a reforma. Segundo o coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV, dificilmente é aprovado uma reformulação quando as “coisas estão indo bem”.


Santi deu exemplo de outros momentos caóticos da história que levaram a discussão de uma reforma tributária, como o Brasil em 1965, durante a ditadura militar e a Europa após a Segunda Guerra Mundial.


Quando tudo isso entrará em vigor?

Ainda não tem uma data para a Comissão Mista analisar todas as propostas, aprimorá-las e colocá-las em prática. O próprio texto de Paulo Guedes ainda não está completo. Sua proposta de três etapas só teve a primeira parte revelada e as demais devem surgir até o final do mês.



Porém, a equipe econômica terá que sobreviver até o final de agosto para que todos comemorem a aprovação, caso aconteça.

No dia 11 de agosto dois secretários especiais pediram demissão da pasta. O acontecimento denominado pelo próprio ministro da economia como uma “debandada”, foi motivado pela insatisfação com o andamento dos projetos que cada um estava envolvido.


Os secretários fujões foram o Salim Mattar, da Desestatização, responsável pelo processo das privatizações e Paulo Uebel, Desburocratização, que estava trabalhando em uma reforma administrativa.


A Folha de S. Paulo fez uma thread sobre o assunto, convido você a dar uma conferida:

Por fim, é isso. Ainda não se sabe ao certo os impactos da reforma tributária sobre a população, mas as suposições não desenham um quadro favorável, pois no final quem paga mais sempre é o cidadão, nós!



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