Alimentação acessível, de qualidade e duradoura: um sonho que muitos países ainda não alcançaram
A data de hoje marca o Dia Mundial da Alimentação e o por Rica Inocente pensou em falar um pouco sobre a importância desta “homenagem” e os impactos que ela vem sofrendo nos últimos anos.
Para começo de conversa, é importante lembrar que o dia está ligado a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), que surgiu em 1945, e vamos falar mais sobre nos próximos tópicos.
O Dia Mundial da Alimentação é comemorado em 16 de outubro para lembrar a criação da FAO e conscientizar a humanidade sobre a questão da alimentação mundial. Não é apenas para lembrar o “quanto o seu prato deve ser colorido”, mas sim a quantidade de pessoas tem acesso a alimentação.
A data levanta pautas importantes como alimentação saudável, acessível, de qualidade, que seja servida para todos e de modo permanente. Porém, sabemos que a realidade não é bem essa. Vemos em pleno 2020 países - como o Brasil - voltado para o mapa da fome e outros continentes - como a África - que continuam lutando contra essa desigualdade.
E além da questão da fome e a falta de acesso a uma comida de qualidade, também vemos como a pandemia modificou os hábitos alimentares da população. O novo coronavírus impactou diversas camadas da sociedade e a alimentação foi um deles.
Por isso, o texto de hoje vai abordar a questão da fome em escala mundial e como a pandemia mudou nossos hábitos. Confira!
Panorama da alimentação
Se a fome é uma antiga assombração da humanidade, a pandemia ajudou a aumentar o seu domínio. Antes mesmo do novo coronavírus, um relatório divulgado pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), “O estado da segurança alimentar e nutrição no mundo 2020”, de julho, mostrou que 8,9% da população mundial foi afetada pela fome em 2019.
A porcentagem equivale a 690 milhões de pessoas no mundo que ainda tem dificuldades em se alimentar. O levantamento também fala que o número de pessoas afetadas pela insegurança alimentar também cresceu: cerca de uma a cada dez pessoas no mundo estava propensa a não se alimentar.
Por via das dúvidas, a insegurança alimentar ocorre quando o acesso e a disponibilidade de alimentos não existe ou são bem baixas. Por exemplo, uma família que não se alimenta frequentemente, não têm acesso a refeições periódicas e de qualidade, caracteriza a condição de insegurança alimentar.
Brasil de volta ao mapa da fome
Falta de emprego. Precariedade das políticas públicas. Miséria. Pobreza. Fome.
Em maio, durante o pico da pandemia do novo coronavírus, um levantamento realizado pelo Programa Mundial de Alimentos (WFP), da Organização das Nações Unidas (ONU), estimou que 5,4 milhões de pessoas entrariam em situação de extrema pobreza, chegando a 14,7 milhões até o final do ano.
Difícil imaginar o que é viver em extrema pobreza, você que possui o seu privilégio e nem racionaliza a desigualdade em que vivemos. Na miséria, você não tem acesso a comida, os fast foods da vida, pedidos por Ifood ou Rappi. Você simplesmente não tem nada e o melhor de tudo, você não tem respaldo social para te amparar.
Em julho deste ano, o relatório da FAO mencionado no começo desse texto, “O Estado da Segurança Alimentar e Nutricional do Mundo”, afirmou que fome voltou a crescer no Brasil. De 37,5 milhões de pessoas que lidava com a insegurança alimentar entre 2014 e 2016, o número saltou para 43,1 milhões de 2017 a 2019.
A reportagem do Fantástico do último domingo, 11 de outubro, “Não sei se vou comer amanhã”, mostrou a realidade de uma família, entre os dez milhões de brasileiros que não se alimentam frequentemente. A matéria retrata o que é não ter condições para alimentar todos os filhos, não ter acesso a benefícios sociais devido a precariedade do sistema, empregos que não cobrem todas as despesas e a falta de oportunidades. Para assistir, clique aqui.
Mesmo assim, temos um governante que afirma que “falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira, um discurso populista”. A declaração foi realizada em julho de 2019, durante a primeira coletiva de Jair Bolsonaro com a imprensa internacional, em resposta ao questionamento do El País sobre a declaração de Rodrigo Maia sobre a realidade das pessoas pobres no país.
Naquela época, 2,5% do país vivia sobre grave situação alimentar de acordo com o levantamento “Estado de Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo 2019”, da FAO.
A eterna batalha africana contra a fome
Mas pior que o Brasil, só o continente africano.
Primeiro que falar da África já é um diferencial, pois todo mundo sabe que os países de lá existem, mas ninguém se comove um pingo quanto a realidade deles. A verdade é que a colonização europeia perpetua suas raízes por lá até hoje.
A dominação estrangeira prejudicou tanto o país que atualmente eles ainda sofrem com as consequência, e a fome é um desses reflexos.
Como já pode se imaginar, a pandemia do novo coronavírus não facilitou as coisas. A propagação rápida do vírus, combinado com a época de enchentes e secas, fez com que 44,8 milhões de pessoas, de 13 países africanos, não tivessem acesso a alimentação básica. Desse montante:
33,6 milhões vivem em áreas rurais;
11,1 milhões moram em áreas urbanas;
Os dados são do relatório da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), divulgado em julho. Apesar do levantamento contar apenas com as informações referentes aos países que fazer parte do bloco regional, os número já ajudam a ter um panorama geral da fome da África.
O mundo continua assistindo tranquilamente ao aumento de 60 milhões de pessoas passando fome em apenas cinco anos, e a África encabeçar a lista de países em grave estado de fome não surpreende a ninguém.
O continente concentra a maior parte da população jovem do mundo, com 60% de pessoas com até 25 anos, o que resulta nas belas imagens de campanhas de ajuda humanitária que circulam nas redes sociais. Desses jovens, o relatório da SADC prevê que até o final do ano que vem 25% deles vão se encontrar em estado de desnutrição, com:
8,4 milhões de crianças passando fome;
2,3 milhões precisando de tratamento para lidar com a desnutrição aguda;
Fechar o olho para isso não vai mudar o fato que eles ainda estão morrendo de fome enquanto você joga mais uma semana de comida fora, pois não fez seu planejamento de compras!
Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO)
E já que a FAO está tão presente nos levantamentos apresentados até então, vamos falar sobre a importância da organização para a conscientização e a prevenção de casos de fome ao redor do mundo.
De acordo com o site da instituição, eles são uma agência especializada da ONU que lidera os esforços internacionais para combater a fome. O objetivo da FAO é garantir que todos tenham acesso a alimentação regular, de alta qualidade e suficiente para que possa levar uma vida totalmente funcional.
A organização realiza projetos em mais de 130 países ao redor do mundo e conta com doações, verbas da ONU e parceria com colaboradores e voluntários para colocar em prática todas as ações de combate à fome.
Para saber mais sobre a FAO e como ajudar, acesse o site deles!
Como a pandemia afetou os hábitos alimentares?
Falar do Dia da Alimentação é lembrar também que os hábitos de consumo das pessoas impactam no estilo de vida e em como elas se alimentam, e a pandemia foi o grande refez da década que mudou a perspectiva da humanidade.
A pandemia começou desencadeando distúrbios alimentares promovidos pela insegurança, medo e depressão causados pelo novo coronavírus. Mais pessoas isoladas, que levavam a pensamentos negativos, o que resultou em mudanças emocionais que afetavam o comportamento alimentar.
Comiam demais, comiam de menos. Refeições pouco saudáveis, sem horários para comer, rotinas confusas. O corpo acaba sentindo essas mudanças abruptas.
Em seguida, veio o medo do aumento da crise alimentar, pois a pandemia jogaria mais milhões de pessoas para a lista de famintos, causando uma catástrofe de “proporções bíblicas”, dobrando o número da população atingida pela fome. O que acabou ocorrendo e foi retratado no começo da publicação.
Com medo do rumo que a pandemia iria tomar, países que abastecem outras nações começaram a barrar as exportações, para poder alimentar a própria população. Mas o que poucos sabem sobre importações e exportações, é que os países não são autossustentáveis e por mais que a gente acredite que tudo o que consumimos é nacional, você está enganado, pois até suprimentos para manter as plantações e os animais são importados de outras regiões.
Então quer dizer, a interrupção de abastecimento criou um efeito dominó em escala mundial, onde os países começaram a lidar com a escassez de diversos produtos provenientes de outras nacionalidades.
Com os mantimentos se tornando cada vez mais raros, a situação agravou quando a população entrou em pânico e começou a estocar alimentos e outros produtos com medo de um fim do mundo generalizado. Se até o momento o acesso a alimentação já não estava fácil, isso piorou ainda mais o quadro.
Mas até então esse foi o primeiro impacto da pandemia na alimentação. O que veio a seguir foi a crise econômica, que jogou milhares de trabalhadores nas ruas, fazendo com que a renda de muitas famílias fossem reduzidas a zero, impossibilitando a compra de alimentos. Sem mencionar o fato que, mesmo com a “ajuda” financeira do governo, o preço de produtos básicos atingiu valores estratosféricos comparados ao orçamento familiar de R$ 300.
A realidade afetou a segurança alimentar e nutricional das famílias, que perderam o poder de escolha na hora de adquirir mantimentos. Compras mais ralas, refeições mais enxutas. O quesito “alimentação saudável” foi jogado no chão e sapateado e mais uma vez, as famílias mais pobres, tiveram lidar com o que tinham nas suas mãos, ou seja, nada.
Por outro lado, para a parcela da sociedade que ainda possuía uma condição mínima de sobrevivência, o comportamento alimentar atingiu um novo patamar, o de foco na saúde. Mais tempo em casa incentivou o brasileiro a aumentar o consumo de refeições mais saudáveis, preferindo a cozinha do que os aplicativos de delivery e frutas ao invés de lanches ou pizzas.
Um levantamento realizado pelo Estudo NutriNet Brasil durante a pandemia mostrou que os brasileiros aumentaram o seu consumo de frutas, hortaliças e feijão, de 40,2% para 44,6%. O estudo foi realizado com 10 mil pessoas de diferentes regiões do país e foi gerenciado pelo Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/USP).
E além dos hábitos saudáveis, também houve um aumento nos índices do consumo consciente, levando muitas pessoas a se aventurarem no vegetarianismo e no veganismo, como uma forma de prevenir uma nova pandemia, causada pelos impactos da ação humana na natureza.
O choque causado pelo Covid-19 trouxe muito mais do que um caos em escala mundial, mas afetou a forma como as pessoas enxergam o próprio prato de comida. Alguns pensam nas consequências que aquela alimentação traz num contexto geral, outros imaginam porque não possuem um prato na sua frente e outros simplesmente tentam controlar a situação comendo tudo o que está pela frente.
O Dia Mundial da Alimentação ganhou uma nova simbologia diante da situação atual. A conscientização que nem todos estão no mesmo barco lutam contra a fome/pandemia, mas que cada um está numa jornada diferente, sendo afetado de formas divergentes.
A lição de casa do dia é: tenha mais noção do que você coloca no seu corpo e como você gerencia os mantimentos a sua volta, pois tudo gera uma consequência. Seu prato jogado fora mata cinco crianças mundo afora e o seu bacon pode ser a causa da próxima pandemia. Tudo está relacionado!
Fonte: G1 | Exame | UOL | Brasil de Fato | Mundo Educação | UFSM | Veja Saúde | TAB | IG
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